20 fevereiro 2016

A era da inocência


Eu ainda estou por aqui, bem menos, pois o computador também não colabora, mas ainda insisto nesse meu espacinho.  Espero que, aos poucos, eu volte a um ritmo com o mínimo de decência.  Então, vamos às últimas...

Na última consulta odontológica, a médica indicou que havia uns 3 dentes moles na boca do Davi, que cairiam em pouco tempo. Muitos dos seus coleguinhas de escola, assim como outros amiguinhos de idade próxima, já estavam desdentados e ele, sofrendo a angústia da espera, perguntava o tempo todo quando seu dente iria cair também.  E aí esse dia chegou, e o primeiro dente que lhe nasceu foi o primeiro que caiu.  Tudo bem que foi meio que forçado, já que ele ficou fuçando o dente.  E qual não foi a sua alegria em ver o dentinho, o buraco na boca e a expectativa da visita tão esperada e badalada da... Fada do Dente!  E qual não foi o tamanho da alegria em encontrar a moedinha deixada embaixo do travesseiro...

Sim, Davi, do alto dos seus 6 anos, acredita em Fada do Dente, assim como em Papai Noel e no Coelho da Páscoa.  Sim, nós incentivamos essas crendices porque acreditamos que elas fazem parte do mundo lúdico da infância, até porque sabemos que vai chegar o dia em que ele irá constatar ou descobrir que nada disso existe.  Porém, eu e seu pai respeitamos esse momento, entramos na onda dele e surfamos nesse acontecimento tão especial.

Apesar das parcas lembranças que tenho, a Fada do Dente não existia na minha infância, até porque este personagem, assim como o Papai Noel, são tradições de outras culturas que se integraram à nossa.  Em relação ao Papai Noel, e apesar de fazer acreditar que ele existe, não sou favorável a associar presentes como recompensa a bom comportamento, por exemplo, porque presente deve ser algo desassociado à formação do caráter.  Davi faz sua lista, eu digo que vou falar com Papai Noel - ou ele mesmo fala -, e que ele vai ver o que pode trazer, porque existem muitas crianças para serem presenteadas e fim.

No caso da Fada do Dente, reconheço que a minha estratégia foi um pouco a de recompensa, sim, pois que ela só traz a moedinha de quem escova os dentes e se não encontrar dentes bons e sem cáries ela deixa para lá.  Escovação é questão de hábito, e esse deve ser incentivado desde cedo.   Sim, dá certo, porque se depender do moleque apenas, seus dentes ficam escovados de qualquer jeito.  Sim, eu ainda escovo os dentes do Davi.  O resultado?  Elogios rasgados da dentista. Sim.  E sim também.

Uma coisa que já postei há muito tempo por aqui é que eu tenho verdadeiro p-a-v-o-r de criança precoce.  Não vejo graça em absolutamente nada naquela criança que se comporta ou é forçada a ter um comportamento que está além da sua idade.  Apesar de estar vivendo a primeira infância do Davi, acredito que cada fase deva ser respeitada.  Não consigo entender quem admire uma criança que, por exemplo, começa a argumentar e contra-argumentar com o nariz empinado, como seu tivesse anos de experiência de vida.  E que fique claro que quando falo de criança precoce não significa aquela criança com inteligência acima da média, mas sim, a que tem um comportamento adulto e fora da sua idade.

Alguém poderá dizer que deixar que a criança acredite nessas fantasias é tratá-la com pouca inteligência ou mesmo idiotizá-la.  Num tempo de inocência roubada com a erotização infantil batendo na nossa cara a toda hora, deixar a criança acreditar que esses personagens existem é, a meu ver, respeitar sua infância e suas limitações e até mesmo um desafio a desconstrução de valores tradicionais.

O fato óbvio é que Davi - e todas as crianças, claro - irá viver mais tempo como adulto do que como criança, então, não vejo a menor vergonha em incentivar sua imaginação na idade apropriada.  Sim, vai ter quem diga que é tudo bobagem, mas... e daí?  Não me importo.  O que eu tento, de alguma forma, é deixar Davi ter uma infância o mais sadia possível, e isso passa por esses momentos de pura inocência e ingenuidade.  São eles que nos fazem ver o quanto a vida adulta é sem graça, o quanto a gente se importa com tantas coisas pequenas, já que a nossa inocência já se foi há tanto tempo.

Não sei se daqui a uns 4 ou 5 dentes ele irá continuar acreditando na Fada do Dente, porque imagino que algum amiguinho pode vir a contar a verdadeira verdade para ele.  Mesmo assim, espero que, até lá, o hábito da escovação já esteja mais fortalecido ainda. Por ora, o que nos resta é guardar algumas moedinhas para que, no momento oportuno, possamos alimentar sua crença.  E ainda bem que a Fada do Dente não desvalorizou a moeda...