Obesidade Infantil

Um dos males do nosso século.  Matéria da Veja São Paulo, que trata deste assunto e que eu gostaria de compartilhar.  A matéria completa você lê aqui.


Os desafios das crianças para entrar em forma

Um problema cada vez mais comum em uma cidade onde quase metade da garotada está acima do peso 



5.jul.2013 por Mariana Barros 
 
O sonho de Alexandre Bitencourt, de 13 anos, é ser ator. Após aparecer em dezenas de comerciais publicitários e fazer curso de atuação, ele se prepara para uma oportunidade inédita: participar da novela juvenil Chiquititas, que o SBT exibirá a partir do dia 15. Além do talento, outra característica foi determinante para que Alexandre conquistasse o papel. Assim como seu personagem, o garoto adora comer e luta contra a balança para perder os quilos a mais. Até bem pouco tempo atrás, sua rotina era pontuada por copos de refrigerante, doces e porções exageradas. “Seu prato de almoço poderia alimentar duas pessoas”, conta a mãe, a enfermeira Kely Bitencourt. Além de Alexandre, ela tem outros dois pequenos glutões: Leonardo, 10, e Nicolas, 6. Para entrar na linha, a turma perdeu o livre acesso à despensa lotada de guloseimas e há um ano vem frequentando aulas de natação cinco vezes por semana.

O trio de irmãos, que aparece na foto acima, representa o retrato de um problema que vem crescendo na cidade: a obesidade infantil. Segundo levantamento recente do programa Meu Pratinho Saudável, projeto de esclarecimento e prevenção feito em parceria do Instituto do Coração (Incor) com a editora LatinMed, um total de 45% das crianças da capital enfrenta dificuldades com a balança (contra 30% da média nacional). Dentro desse grupo, 19% apresentam excesso de peso (ou seja, possuem índice de massa corporal, IMC, entre 25 e 30). E 26% delas estão obesas (IMC acima de 30). A pesquisa em questão avaliou quase 500 paulistanos entre 2 e 9 anos de idade.

Os números ajudaram a quantificar um fenômeno para o qual os especialistas já vêm chamando atenção há algum tempo. Pouca atividade física, falta de tempo para brincar, alto consumo de produtos industrializados, como refrigerantes e sanduíches de fast food, e pais que trabalham fora e não acompanham a alimentação dos filhos são os grandes complicadores. “Nas últimas décadas, trocamos o medo da desnutrição pelo exagero e descontrole que resultaram na obesidade”, afirma Ieda Jatene, chefe do departamento de cardiologia pediátrica do Hospital do Coração (HCor).

Algumas das principais causas de morte por infarto, derrame, câncer e diabetes têm como base a (má) alimentação. De acordo com projeções da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil liderará até 2040 o ranking de países com o maior número de óbitos por problemas cardiovasculares, seguido por China e Índia. O excesso de peso na infância está relacionado a essa estatística sombria. “Se nada for feito, esses jovens viverão cerca de dez anos menos do que seus pais”, alerta o cardiologista Mauricio Wajngarten, do Incor.

A obesidade infantil pode ser desencadeada por vários fatores, incluindo questões psicológicas, como uma crise de ansiedade às vésperas de um evento importante, a exemplo de uma prova na escola. Aos poucos, porém, fica cada vez mais claro que o comportamento dos adultos representa um dos maiores problemas. “Os filhos refletem o que os pais fazem, para o bem e para o mal”, diz Eduardo Calliari, endocrinologista pediátrico da Santa Casa e do Hospital São Luiz. Para ele, o crescimento do número de mulheres com sobrepeso está diretamente relacionado ao aumento da taxa infantil, pois costumam ser elas as principais responsáveis pela alimentação dos rebentos. Segundo a médica Maria Edna de Melo, da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrone Metabólica (Abeso), a falta de sensibilidade dos familiares também prejudica os tratamentos de emagrecimento e reeducação alimentar. “Comer guloseimas na frente de quem está encarando restrições é uma forma de tortura”, exemplifica.


Na tentativa de virar esse jogo, a Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) criou recentemente um fórum permanente de prevenção voltado a crianças e adolescentes e coordenado pelo cardiologista Wajngarten. O grupo, que fez sua primeira assembleia no congresso da Socesp no fim de maio, reúne representantes da indústria alimentícia, jovens, pedagogos, pesquisadores e médicos em busca de soluções para o que já é considerado uma pandemia.

Os erros começam ainda nos primeiros meses de vida. “Vemos farinhas ricas em açúcar e refrigerante na mamadeira”, relata a nutricionista Karine Durães. Já as crianças em idade escolar precisam driblar a tentação dos lanches da cantina. Nas escolas da cidade é possível encontrar da tradicional coxinha a quiosque de fast-food. Um estudo da Sociedade Brasileira de Cardiologia coordenado pelo médico Carlos Alberto Machado mapeará a partir de agosto os hábitos alimentares dos estudantes de 128 colégios estaduais em vários municípios paulistas. Com base no levantamento, os salgadinhos serão gradativamente substituídos por alimentos naturais e integrais. Para chegar a esse objetivo, que deve começar a ser posto em prática no ano que vem, uma equipe está por videoconferência treinando diretores, professores e merendeiras. Algumas instituições de ensino particulares têm seguido essa mesma linha. A Escola da Vila, com unidades no Morumbi e no Butantã, depois de ter banido recentemente da cantina frituras e hambúrgueres, planeja dar fim também à oferta de refrigerantes.

Outra frente de batalha envolve a publicidade direcionada aos jovens. Em 2011, o Procon multou o McDonald’s em 3 milhões de reais e, no ano passado, o Habib’s em 2 milhões de reais por fazerem propaganda de lanches com brinquedos. Neste ano, o governador Geraldo Alckmin vetou um projeto de lei que proibia a venda casada de alimentos pouco saudáveis, como fast-food, com brindes. Iniciativas semelhantes seguem em tramitação. A mais emblemática delas, que amplia a restrição das peças publicitárias para o público infantil, espera por aprovação desde 2001.

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A ampla presença de alimentos industrializados na rotina dos pequenos é o tema do documentário Muito Além do Peso, da cineasta pau listana Estela Renner. Ela foi estudante de nutrição e pilotou o fogão nos sete anos em que viveu com seus filhos — de 6, 9 e 11 anos — nos Estados Unidos. Após um mês em cartaz no fim de 2012, o longa segue no ar na internet (www.muitoalemdopeso.com.br), na qual já teve mais de 500 000 exibições. No começo do filme, as crianças são desafiadas a reconhecer frutas e leguminosas como mamão, manga, abacate, pimentão, beterraba e mandioquinha. Ninguém acerta. Quando a charada é identificar a marca por trás das tarjas colocadas em pacotes de salgadinhos e bolachas, todas sabem de cor o nome do produto.

Em outra cena, a bióloga Maluh Barciotte mostra um bolinho que foi servido a ela durante uma excursão escolar há um ano e meio. Passado todo esse tempo, o doce continua intacto, sem nenhum bolor. “Nem fungo se interessou por ele”, diz. A fabricante do doce é a mesma que fornece os bolinhos da merenda municipal, distribuída em 2.600 endereços, entre escolas, creches e entidades conveniadas — por dia, a prefeitura serve 1,8 milhão de refeições a crianças.

Quando soube da coincidência, Erika Fischer, diretora do Departamento de Merenda Escolar da prefeitura paulistana, solicitou à empresa fornecedora uma nova fórmula com menos açúcar e com ingredientes integrais. “Somos responsáveis pelo que está acontecendo agora e pelo que acontecerá no futuro”, justifica Erika, que comanda uma equipe de cinquenta nutricionistas.

Cardápios infantis compostos de salsicha, macarrão e pedaços de frango empanado são comuns na cidade. Nos Estados Unidos, é igualmente facílimo encontrar um lugar que ofereça essas iguarias ao paladar infantil. No best-seller Crianças Francesas Não Fazem Manha (272 páginas; 29,90 reais; editora Fontanar), a americana radicada na França Pamela Druckerman questiona esse hábito. Surpresa com os bons modos à mesa dos pequenos franceses, ela investiga os pilares da maneira local de criar filhos. Descobre que a mesma refeição, em casa ou no restaurante, é oferecida tanto a adultos quanto a crianças. “Aceitei que é meu dever ensinar meus filhos a gostar de uma variedade de sabores e a fazer refeições equilibradas”, escreve a autora.

Os hábitos à mesa impactam até a formação da personalidade da garotada. Um estudo da Universidade Columbia, em Nova York, revela que fazer ao menos quatro refeições por semana com a criança reduz o índice de consumo de drogas na adolescência, a agressividade, a depressão e a obesidade. “Criança não deve fazer dieta temporária, e sim reeducação alimentar”, resume o endocrinologista pediátrico Eduardo Calliari. “Sem que os pais entrem na dança, essa tarefa se torna impossível.”

DE OLHO NO ESPELHO

Algumas regras que os pais devem seguir para garantir a saúde dos filhos 

1. Tire da rotina refrigerantes, sucos prontos, salgadinhos, fast-food, enlatados, embutidos e carboidratos em excesso. Nos fins de semana é possível abrir exceções, mas sem perder o controle.

2. Saiba ler o rótulo dos alimentos. O primeiro ingrediente da lista é o que existe em maior quantidade no produto. O açúcar pode aparecer descrito como carboidrato.

3. Para escapar das tentações das festinhas de aniversário, sirva um lanche antes de sair de casa. Combine com seu filho a quantidade máxima de docinhos, salgadinhos e refrigerantes a ser devorados.

4. Sempre que puder, inclua os pequenos na compra de alimentos e em seu preparo. Levá-los à feira e ao supermercado e fazer receitas junto com eles ajuda a despertar a consciência sobre a alimentação.

5. Ensine a seu filho o que faz bem e o que faz mal à saúde, para que ele possa fazer escolhas corretas quando você não estiver por perto, como na escola e no shopping com os amigos.

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